Tuesday, April 25, 2006

Ritmo da Liberdade























Toda a música que ouço.
O coro de vozes, o estremecer de pés.
Todas as emoções. Batem em mim.
Batem como o vento no mar.
Causam ondas.
Ondas não duram mais que a sua chegada à praia.

Tenho a minha vida cortada em dois.
Por pessoas. Por músicas. Por cidades.
Despedaçada em mil pedaços.
E no entanto sinto-me feliz.
Feliz a explodir. Feliz como uma criança.
Porque não? Porque não sentir um paradoxo e tomá-lo num sorriso que é o teu?

Sinto este corpo a arder.
O meu. Sei que ele arde por mais que uma razão.
Por tudo o que veio antes dele. Por tudo o que ele é agora.
E. Por tudo o que ele será.

Por tudo o que és e não deixas de ser. Sê tu mesmo. Sê ninguém.

Monday, April 24, 2006

Caminhos Escondidos

















Posto acima do mundo.
Vejo o caminho antigo.
O caminho escondido.
Cheiros sempre foram
mais que importantes.
Neste caminho escondido.
Toda a minha vida andei.
Nesta escuridão escondida.
Agora é coberta.
Por uma tapeçaria mais que verde quase amarela.
Liberto-me agora do caminho.
Escondido. Diferente. Igual.

Compreendes?



Everyone wants to live forever
Thinkin' that it'd be a lot better
Everyone wants to live forever
whoah
The Flaming Lips - Talkin' Bout the Smiling Deathporn Immortality Blues

Sunday, April 23, 2006

Leão de Domingo

No fundo
sempre soube
que ele voltaria a aparecer.
O Rugido.
Alter-ego semi-permanente.

Já sabes como eu sou,
grande eu, pequeno eu.
Nunca médio eu.
Adoro as montanhas e os vales,
nunca gostei muito de planaltos.
Se for tem que ser em grande.
És tu que me transmites
esta megalomania.

E mesmo amando esta estúpida dimensão,
nunca gostei muito da grandeza
dos sentimentos mesquinhos, por tua causa.
Não me deixo consumir.
Tento resolver os meus problemas.
Como já me avisaste mais que uma vez.
E estamos ligados,
agora e para sempre.
Neste constante devir que é a vida.

Transforma-me amor da grandeza,
e,
Ruge para mim,
eu-mesmo.

Friday, April 21, 2006

Cenário


Sou eu sentado no sofá, a luz apagada

[olha para a luz]

a luz apagada, a porta fechada ou aberta

[olha para a porta]

a porta fechada ou aberta, não faz diferença, está escuro e não consigo ver bem a porta.

Sou eu sentado no sofá, a luz apagada, a porta fechada ou aberta, não faz diferença.

[pausa]

Na minha frente a mesa pequena onde se colocam revistas, jornais, pedacinhos de queijo e bolachas para quando tenho visitas, o comando da televisão e os pés, quando vejo televisão. Agora está lá o portátil aberto, e a luz do portátil na minha cara.

[pausa]

Atrás da mesa pequena com o portátil aberto e o comando da televisão, a televisão desligada.

[pausa]

Desligada não, em Stand By, essa forma meio-desligada de se estar.

[pausa]

A luzinha vermelha

[olha para a luzinha vermelha]

a luzinha vermelha no canto inferior direito como que a dizer

- Ainda estou aqui

[pausa maior]

Sou eu sentado no sofá, a luz apagada, a televisão em Stand By e o portátil aberto. Estou a ver as tuas fotos. Tu com o teu casaco amarelo

- Pareces um canário

e tu amuada

- Mas eu adoro canários, parva

e tu a perdoar-me o ser bimbo e a dar-me um beijo

- Canário és tu

[pausa maior]

Lembras desse dia? Nós os dois no centro comercial a comprar pilhas para a máquina digital que me deste no natal

- Para tirarmos fotos juntos

[pausa, olha para a luzinha vermelha]

Nós os dois na zona de alimentação do centro comercial, eu um café com leite e uma torrada com manteiga, tu um pastel de nata e um compal de laranja

[pausa]

ou de pêssego

[pausa]

Eu a tirar-te fotos e tu a rir

- Pára com isso

eu a tirar-te fotos e tu a fazeres-te de irritada

- Deixa-me comer em paz

eu a tirar-te fotos e tu

- Devo estar horrorosa, depois apagas essas fotos

eu a tirar-te fotos e tu

- Prometes?

[pausa]

Não apaguei as fotos. Quando cheguei a casa, nesse dia, fui logo passar as fotos para o portátil e colocá-las na pasta As Minhas Imagens.

[pausa]

Só agora é que reparo nisto, na pasta As Minhas Imagens não há nenhuma imagem minha, só imagens tuas.

[pausa maior, olha para a luzinha vermelha]

Sou eu sentado no sofá, a luz apagada, a televisão em Stand By e o portátil aberto com o teu casaco amarelo e o teu compal de laranja

[pausa]

acho mesmo que era de laranja

[pausa]

Selecciono todas as tuas imagens

(não são assim tantas)

para depois carregar na tecla Delete

[olha para a tecla Delete]

certo de que assim sairias mais rápido daqui

[pausa]

certo de que sairias mais rápido de mim

[pausa maior]

Sou eu sentado no sofá, a luz apagada, a televisão em Stand By e o portátil aberto com a tecla Delete a olhar para mim

[olha para a tecla Delete]

e eu a não conseguir carregar nela.

[pausa]

Ligo a televisão

[carrega no botão verde no canto superior direito do comando da televisão]

e, atrás do portátil aberto, vejo os canais a mudarem sem conseguir perceber o que está em cada um

[carrega no botão + PROG]

a sala a ficar alternadamente clara e escura e, no portátil aberto, ainda o teu casaco amarelo e tu a fazeres-te de irritada, a olhar para mim

- Devo estar horrorosa, depois apagas essas fotos

a sala alternadamente clara e escura

- Prometes?

[pausa maior]

Desligo a televisão

[carrega no botão verde no canto superior direito do comando da televisão]

e de novo a sala escura, só a luz fraca do portátil aberto e de novo a luzinha vermelha como que a dizer

- Ainda estou aqui

[pausa]

Sou eu sentado no sofá, a luz apagada, a televisão em Stand By, as tuas fotos todas seleccionadas

(não são assim tantas)

e a tecla Delete a olhar para mim

[olha para a tecla Delete]

tão pequena

[olha para a luzinha vermelha]

tão insignificante

[pausa]

e o meu indicador

[olha para o indicador]

tão pequeno

[olha para a luzinha vermelha]

tão insignificante

[olha para o indicador em cima da tecla Delete]

a carregar na tecla Delete

[carrega na tecla Delete]

[pausa maior]

É o sofá vazio, a luz apagada, a televisão em Stand By, a luzinha vermelha no canto inferior direito como que a dizer

- Ainda estou aqui

o portátil aberto, o teu casaco amarelo, o compal de laranja e o teu ar irritado

- Prometes?

Saturday, April 08, 2006

Podes abrir...


Heaven’s gonna burn your eyes
thievery corporation

os primeiros raios de sol entre a tempestade
são sempre os mais saborosos.
o calor refrescante atinge-te as folhas
cobertas de água escorregadia.
e enquanto isso se passa, podes sentir
o final da tempestade a penetrar a terra,

e continuas a jornada de crescer.
sempre. até atingir o céu.
e ele te queimar os olhos fechados.

Podes abrir...

Thursday, April 06, 2006

rain?


Deflagra-se uma guerra orgânica dentro de mim.
Sabendo à partida o vencedor e o vencido,
os invasores continuam a tentar.
É inevitável.
Como a chuva que cai lá fora,
a luta pela vida inconsciente e desesperada
destes pequenos seres é parte de um ciclo.
Coexistência. Competição.
Vida. Morte.
Todos fazemos parte dum ciclo.
Fases.
Tal como a fénix
que se consome num fogo purificador e rejuvenescedor,
assim o meu corpo debate-se com um inferno auto-imposto.
Pronto para o renascer debaixo do sol...


All I do is pray the lord above will let me walk in the sun once more.
Can’t go on, ev’rything I had is gone
Stormy Weather, Billie Holiday

Sunday, April 02, 2006

sem (t)alento


Escrevo em verso
mas não é poesia.
Tento a prosa,
mas não é verosímil.

O meu escrever
esbate-se
em barreiras impostas
por outros
vindos antes de mim.

Deram-me inspiração
e começaram eles mesmos
a instigar esta vontade,
mas nunca me avisaram
desta ridícula dificuldade.

Escrevo mas não sou eu.
Sou eu mas não escrevo.
Penso quebrar regras,
mas apenas volto
para uma prisão maior.

آب از سر چشمه گل آلوده - Water is muddy at the fountainhead